25 de setembro de 2014

A Lista Negra - Jennifer Brown

A resenha não contém spoiler, todos os fatos citados fazem parte da sinopse e/ou abas/orelhas do livro. Muita gente acha que pela quantidade de informações passadas, há revelação do enredo, mas não, essa é exatamente a premissa do livro, não revelei nada que a sinopse não tenha revelado.


CYMERA_20140925_094856Edição: 2
Editora: Gutenberg
Ano: 2013
Páginas: 272
Tradutor: Claudio Blanc
★★★★★


Quando algo te conquista como A lista negra fez comigo, se torna extremamente difícil falar sobre ele. A premissa do livro já era algo que me instigava, exatamente por tratar de bullying, um assunto que gosto de ler e falar sobre. É algo muito sério e que, muitas vezes, vemos ser desmerecido e menosprezado no dia-a-dia.
A autora nos leva à vida de Valerie, uma garota que, junto com o namorado Nick, sofria diversas formas de bullying, praticado pelos companheiros de escola. No intuito de extravasar toda a raiva que sentia, nossa protagonista faz uma lista com as coisas e pessoas que mais odeia. A lista negra. Nick toma parte nisso e assim os dois ficam envolvidos em listar aqueles que os desagradam. Sem ao menos notar, as coisas ficam sérias demais e num determinado dia, Nick chega à escola dizendo que vai resolver os problemas de ambos, é quando ele saca uma arma e começa a atirar naqueles que há muito estavam marcados na lista.
'Meu Deus', pensei. 'A Lista. Ele está pegando as pessoas que estavam na Lista Negra.'

Mesmo abalada por ver o próprio namorado fazer uma coisa dessa magnitude, Valerie reúne forças dentro de si e encontra a única forma viável de tentar parar aquele caos: jogando-se na frente de uma das vítimas; sendo atingida por um tiro vindo do próprio namorado.
É um livro pesado, carregado de emoções fortes e que te prende num enredo e em personagens complicadíssimos. Você vai amar e odiar, chorar e até sorrir. Jennifer nos leva a um universo tão perfeitamente real que é capaz de nos lembrar tanto de nós mesmos, quanto de pessoas ao nosso redor. A lista negra é uma daquelas obras que você quer repassar para o maior número possível de pessoas, que te faz querer que o mundo conheça e aprecie.
Os dilemas da vida de Val, além de sérios, sabem como te levar a não querer largar o livro até que vire a última página.
Deparei-me com uma ótima narrativa em primeira pessoa, que oscila entre passado e presente, e ainda possui algumas reportagens complementares - fictícias e ligadas ao enredo. Repleta de personagens complexos e bem criados, a família de Valerie também possui um papel importante no decorrer da história. A falta de compreensão já muito presente no livro, tende a ser ampliada com os acontecimentos do fatídico dia 2 de maio de 2008. A própria protagonista vive o dilema de se perdoar, tentar compreender o namorado e entender os próprios sentimentos com relação às mortes que aconteceram bem na sua frente.
O que fazer quando você deseja que alguém morra e isso acontece? E se, apesar de tudo, você ainda nutrir sentimentos pelo jovem que fez isso? Quando se sentir culpada parece a única saída, como levar a vida adiante? É impossível ler algo assim e não tentar se colocar no lugar da personagem principal, que além do perdão de seus parentes e dos colegas, tem que buscar ser perdoada por pais que perderam seus filhos e estão desolados.
Em alguns dias, chegar ao fim do dia é uma grande vitória.

Recomendo demais esse livro, foi uma das leituras mais interessantes que já fiz na vida e com certeza se tornou um dos meus preferidos no momento em que sequei a última lágrima e virei a página final.

No skoob (;
E aí, já leram? Ainda não? Deixe nos comentários!

25 de junho de 2014

Rotina

12 de Novembro de 2009
Pela primeira vez naquela semana acordara cedo, estava feliz com o feito. Ainda incrédula olhou o relógio digital na cabeceira da cama e este marcava 06h15min. Seguiu em direção ao banheiro e tomou um banho demorado, vestiu sua habitual roupa de trabalho e comeu a primeira fruta que achou na sua frente. Deu risada sozinha do costume que tinha de fazer tudo muito rápido por estar sempre atrasada. Resolveu sair de casa assim que se julgou totalmente pronta. Vestia uma calça social preta e a camisa branca, com o emblema da empresa que trabalhava.
Seria um dia cansativo, e mesmo estando alegre por ter a certeza – ou quase – de que chegaria e não teria que ouvir sermão de ninguém de seu setor, abateu sobre Julie uma tristeza repentina por não ver mais sentido naquilo tudo. Queria sentir a mesma calma de antes quando sentia o vento bagunçar seus cabelos soltos, ou mesmo, sentir o sol em seus braços e sorrir a toa. Como queria que tudo voltasse a ser como antes...
Assim que chegou à empresa, viu seus colegas e amigos reunidos em uma roda que foi desfeita com a recém chegada do chefe de seção. Olhou desconfiada para todos eles, mas seguiu para sua mesa.
Tanto quanto havia imaginado, ou mais que isso, o dia havia lhe cansado, não parecia ter sido 6 horas naquela sala, mas sim 16. Despediu-se dos amigos e em menos de cinco minutos estava no ônibus que a levaria para seu lar; mais uma vez naquele dia, sentiu-se estranha por estar sozinha, como se já não fosse habitual. Balançou a cabeça e colocou os fones no ouvido para afastar pensamentos sem importância. Notou um garoto alto a olhando com o sorriso debochado nos lábios, imaginou ser pela enorme mancha laranja em sua camisa – que estava ali por culpa de sua aptidão para desastres. Rolou os olhos e não se incomodou quando o viu comentar com os amigos algo que provavelmente dizia respeito a ela.
Nem um minuto a mais, nem um minuto a menos, chegou a sua casa no horário costumeiro.
Lavou as mãos e foi preparar algo pra comer. Enquanto o fogo aquecia sua comida, que naquela noite fora apenas um macarrão instantâneo, foi trocar de roupa. Vestiu o mesmo pijama de sempre, azul claro com pontinhos brancos. Revirou os olhos para o estado daquela roupa, um buraco bem feio na altura do cotovelo. Andava tão desleixada.
Depois de comer o que, com carinho, chamava de gororoba, foi tomar um banho. A água quente batia no corpo com delicadeza; talvez o chuveiro fosse a única coisa que funcionasse decentemente no cenário deplorável que era seu apartamento.
Ainda com dó, girou a válvula depois de cinqüenta minutos debaixo do chuveiro. Saiu enrolada em uma toalha e voltou a colocar o pijama rasgado. Deitou-se, ou jogou-se, na cama e puxou as cobertas para cima de si. Foi realmente, naquela noite, sua única preocupação, já que se esqueceu até de colocar comida para o gato de estimação, e deixou-o olhando para o pote vermelho e vazio a sua frente.
Dormiu, e diferentemente dos outros dias, relaxou na cama, talvez fosse o cansaço, talvez o frio, mas realmente dormiu bem.

...


Por algum tipo de magia, e provavelmente magia negra, havia acordado tarde naquele dia. Pela quinquagésima vez estava olhando no relógio. Não acreditava que era mais de 07h00minh. Tinha que estar na faculdade em exatos 15 minutos, e sabia que, naquela altura, o feito era totalmente impossível.
Não estava acostumado a fazer tudo tão rápido, mas conseguiu, em questão de poucos minutos, fazer a higiene matinal, escolher uma roupa decente e comer a primeira fruta que encontrou.
Saiu de casa quase se esquecendo do essencial: o material para as aulas. O vestuário era uma camisa azul com algum escrito em branco, a calça era um jeans de lavagem escura, e nos pés havia um tênis preto.
Por sorte, o ônibus não demorou a chegar e em alguns longos minutos, o garoto estava entrando na sala sob o olhar revoltado do professor de história da arte. Ao contrário do que cada pessoa disposta em fileiras exatamente iguais na sala de aula queria, o horário pareceu se arrastar, e as horas dentro do centro acadêmico, pareceram dias. Após o abençoado intervalo, vieram mais algumas aulas, e lá estavam os jovens e adultos saindo apressados para suas casas, ou seus empregos, como era o caso de Joe que se despedia dos amigos com certa pressa.
O tempo no trabalho, apesar de lento, fluiu bem e sem as confusões que ultimamente eram frequentes.
A noite mal dormida lhe causou um sono anormal durante o período em que esteve fora de casa; e já no ponto de ônibus estava dando graças a Deus por estar só, e rezando para que a condução que o levaria para seu lar estivesse vazia; precisava de um tempo sozinho... Sozinho e sentado.
Sorriu ao ver, mesmo que longe, o veículo que esperava, mas aos poucos, de acordo com sua aproximação, viu chegar ao seu lado um grupo de amigos do trabalho.
“Saiu correndo”, “Não custava esperar”. Essas e outras frases entravam em seus ouvidos fazendo com que rolasse os olhos com descaso. Seus planos de ficar sozinho rolaram ladeira abaixo, só restava continuar a torcer para que ao menos conseguisse se sentar. Mais uma desilusão.
Após se sentar por duas vezes e ter que levantar para dar o lugar a um idoso, resolveu desistir de descansar as pernas e permaneceu em pé, apenas puxando os fones de ouvido da mochila e colocando no ouvido. Não deu atenção e nem se importou quando os amigos reclamaram da falta de consideração.
Mais tarde, ao longo da viagem do trabalho para a casa, deu-se conta de um dos garotos ao seu lado lhe falar algo referente a alguém que estava toda suja no ônibus. Mais uma vez ignorou. Minutos depois sentiu algo cutucando sua barriga e percebeu ser o braço de um dos amigos, olhou para ele irritado, e seguiu a direção que este olhava, só podia ser a tal garota, mas não deu a importância que o outro esperava, e voltou a se concentrar na música.
Parecendo que dali para frente era uma outra cidade, lá estava Joseph olhando o enorme engarrafamento que se formava; o que lhe causou um cansaço ainda maior. Chegou ao apartamento bem mais tarde que o costume. O porteiro do prédio já havia trocado seu turno e quem estava lá era o velho rabugento – palavras de Joe – que lhe encarava com ódio por algum motivo desconhecido.
Subiu para seu andar e assim que entrou em seu tão esperado lar, jogou-se no sofá se preocupando apenas em colocar a comida do cachorro e em tomar um banho rápido. Não viu as horas passarem, só notou que os programas da madrugada iam ficando mais e mais chatos, e logo se deixou levar pelo sono.

13 de Novembro de 2009
Enfim tinha voltado ao normal, estava atrasada. Como de costume, pegou a primeira fruta que viu e saiu comendo assim que terminara de tomar o habitual banho ultra sônico – palavras de Ellie. O dia no trabalho foi a mesma coisa, apenas pareceu, mais uma vez, mais longo que o normal. A condução estava o mesmo caos, e hoje o trânsito também não colaborava. Perguntou-se, em silêncio, o porquê daquela quantidade exagerada de carros na rua, e chegou a conclusão de que era esse o resultado de morar na maior metrópole do país e estar a véspera de um feriado prolongado. Rolou os olhos e pela primeira vez reparou nas pessoas que estavam no ônibus; na catraca, passava uma mulher segurando a mão de uma criança, que deduziu ser sua filha. Mais atrás um jovem alto de cabelos desgrenhados e aparência cansada. Percebendo que suas observações não tinham fundamento, colocou os fones de ouvido e deu atenção apenas à voz de seu cantor preferido.

...

Como nos outros dias de sua agitada vida, tinha acordado na hora certa, nem tarde, nem cedo, era o horário perfeito. Deu tempo de demorar o quanto pôde embaixo do chuveiro e ainda assim, tomar um café da manhã reforçado.
Não pelo fato de estar adiantado, mas pareceu ficar horas na sala de aula. E o serviço? Fora horrível, os segundos se arrastaram e pareceram minutos, enquanto os minutos e as horas seguiram a mesma lógica. Como era de se esperar, estava rodeado de amigos no momento em que subiu para o ônibus, mas ao contrário dos outros dias, havia lugar para se sentar, não muitos, mas havia. A mulher com uma criança sentou-se no banco próximo a porta, colocando o filho ao seu lado. Ainda restava um lugar no fim do ônibus, e ignorando a presença das companhias, seguiu pra lá e puxando o celular do bolso sentou-se ali. A garota a sua direita estava entretida demais com os fones de ouvido e com a paisagem poluída do lado de fora, que sequer notou a presença do rapaz. Joe olhou o aparelho em sua mão e notou que estava sem bateria, o que acabou, subitamente, com seu desejo de ouvir música. Rolou os olhos e acabou bufando alto, assustando a menina ao seu lado. Esta o olhou e quando ia virar ouviu a voz cansada do jovem.
- Desculpe. – E um sorriso sem graça.

...


- Tudo bem. – Sorriu em resposta.
- Vai viajar também? – Joseph tentou puxar assunto enquanto “admirava” a janela do ônibus.
Depois de poucos segundos a menina pareceu entender o porquê da pergunta e respondeu mostrando seu descaso em sair de casa.
- Definitivamente não, e você? – Imitou a pergunta apenas por educação e viu o menino balançar a cabeça negativamente.
Sem um motivo aparente, eles continuaram a conversa desinteressante, e logo estavam rindo juntos, sem se importar com os olhares que lhes eram lançados.

...


De repente, como uma espécie de milagre, a rotina tinha mudado. Todos os dias, depois do trabalho, lá estavam os dois em um telefonema extenso, que por vezes chegava as 03h00min da madrugada, falando o quão cansativo fora o dia, e a saudade que sentiam um do outro.
Alguns acreditam em Deus, outros em amor à primeira vista, poucos, nas duas opções simultaneamente. Nem eles mesmos podiam explicar o que lhes havia acontecido, só tinham a certeza de que de repente tudo havia mudado, e para melhor, com certeza.

Epílogo


Ambos estavam cansados, mas aproveitavam um ao outro como podiam. Ele não agüentava mais pensar no TCC da faculdade, ela não via a hora de ser, oficialmente, promovida na empresa.
Em um canto do apartamento, estavam um gato e um cachorro se encarando com curiosidade. Mais a frente um pote vermelho cheio de ração para gatos, e ao lado um azul com ração canina.
No centro da sala uma TV com programas chatos de uma madrugada fria, quase não tinha som. E naquele cenário de inverno ainda era possível ver um casal no sofá, ela com um pijama branco com desenhos de travesseirinhos – presente do noivo –, ele com uma calça de moletom preta e camisa branca. Ambos, apesar do cansaço, estavam rindo a toa, afinal naquele dia quem tinha preparado o café reforçado fora a menina, que acordara mais cedo que o normal, e quem mal havia comido as panquecas feitas com carinho, era ele que acordara bem mais tarde que o habitual.
E assim mais dias se seguiram. Vez ou outra, eles revezavam quem dormiria na casa de quem, e desta vez, os sorrisos bobos, telefonemas e noites acordadas, eram mais freqüentes, tudo pelo fato, de em um determinado dia, terem reparado nas pessoas a sua volta.

Universo Tácito

Universo: Do latim universu, universal, geral, todo, inteiro.
Tácito: Do latim tacitus, não expresso em palavras.

É difícil se apresentar, falar de si; é difícil se entender. É impossível colocar em palavras o que se é; é tácito. Expor seu mundo à outros requer coragem, um pouquinho de ousadia e um toque de paciência. Jogar-se ao julgamento alheio é assustador, é estranho e até um pouco ruim. Colocar seu universo particular à vista dos outros é ao mesmo tempo intenso e tranquilo, afinal, é falar do seu dia-a-dia, do que gosta e do que não gosta, do que ama e do que odeia. Mas como expressar o que sente? Como passar aos outros suas sensações e esperar que eles entendam? E nessa ânsia de partilhar sentimentos, o Universo Tácito surgiu. Uma letra, uma palavra, uma linha de cada vez.